Por JOÃO RAMOS DE ALMEIDA
Quarta-feira, 24 de Março de 2004
As cobranças fiscais arrecadadas desde 1 de Outubro de 2003 serviram para financiar a parte da operação de titularização de dívidas fiscais e da Segurança Social aprovada em 2003, refere a nota da sociedade de rating Fitch distribuída anteontem. Esta indicação contraria as declarações do secretário de Estado do Orçamento no Parlamento sobre o mesmo assunto.
A nota refere que serão colocados nos mercados internacionais 1,663 mil milhões de euros, ou seja, um montante abaixo dos 1,765 mil milhões adiantados pelo Citigroup ao Estado português e que contribuíram para cumprir as metas orçamentais de 2003. Esse valor mais baixo resulta já da amortização feita com a cobrança fiscal verificada desde 1 de Outubro de 2003 e ainda de juros.
Por outro lado, a nota descreve a carteira - ontem publicada no PÚBLICO com erros, pelo que hoje se repete - como possuindo cerca de 70 por cento com a melhor classificação (AAA), fruto de uma avaliação mais prudente. Esse facto, segundo a própria Fitch, poderá não se traduzir numa taxa de remuneração mais barata para o Estado português do que a que teria se emitisse dívida pública (avaliada com AA), uma vez que se trata de uma operação anormal nos mercados, só conhecida em Itália e em moldes diferentes. "Será expectável que o custo médio da operação seja superior ao rating da República", afirmou ao PÚBLICO o director associado na área da Europa da Fitch, João Ferreira Marques. A nota adiantou ainda dados que o próprio Governo não facultara, como um conjunto de indemnizações e compensações, excepcionalmente a cargo do Estado português.
A nota levou inclusivamente grupos parlamentares a questionarem o Ministério das Finanças, designadamente sobre novos riscos. Francisco Louçã questionou "como se justifica a consignação de uma receita de impostos ao pagamento de uma dívida ao Citigroup". Por outro lado, tanto Francisco Louçã como Lino de Carvalho do PCP pediram explicações sobre a redução dos valores tanto dos títulos vendidos (1,663 mil milhões em vez dos 1,765 mil milhões), bem como das dívidas fiscais (de 10,95 mil milhões e não 11,44 mil milhões). Em terceiro lugar, Louçã perguntou se a possibilidade de recompra - nunca aventada pelo Governo e agora assumida pela Fitch - não "demonstra uma incerteza suplementar acerca da credibilidade dos créditos titularizados" e quanto se prevê vir a pagar por essa recompra.
Lino de Carvalho cita a Fitch para lembrar que, ao contrário do que foi afirmado pela ministra das Finanças, caso haja anulação das dívidas tituladas, o Estado português terá de substituí-las ou readquiri-las a um preço a definir e noutros casos ("amnesties, discounts, time extension" e "payments in kind and offsets") o Estado terá mesmo de compensar o Citigroup/Sagres por um valor que não está determinado". Ambos os deputados questionam a razão do silêncio da ministra sobre estas matérias e por que razão não remeteu todos os elementos prometidos e necessários para avaliar a operação.
No mesmo dia em que a Fitch divulgava a sua nota, outra sociedade de rating igualmente contratada pelo Estado, a Standard & Poor's, divulgava a sua. Essa sociedade sossegou os investidores que não haverá renovação das dívidas, que todas as receitas a cobrar pelo Estado serão usadas para pagar os títulos e que "não serão compradas dívidas adicionais". O Ministério das Finanças não comentou esta nota. Este aviso elogiou assim a liquidez dos títulos, mas alerta igualmente para o facto de o direito de Portugal de efectuar amnistias fiscais poder reduzir o valor da carteira, uma vez que o Estado "desiste dos juros quando ocorre uma amnistia". Mas salienta que há mecanismos para compensar os investidores.
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